segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O corpo e seus segredos

Muitos pensam que sentir dor é apenas um mau funcionamento do organismo. O organismo vivo não pode funcionar porque não é máquina, ele não tem engrenagens. O corpo vivo se auto-organiza para manter sua estrutura íntegra. São aspectos diferentes. Qualquer analogia com as máquinas é estar à mercê de equívocos.
O corpo humano pode ser interpretado pelo mecanicismo, sem conjurar aspectos complexos. Ao me remeter à complexidade quero afirmar que o corpo é referência relacionada a uma miríade de outros aspectos.
Infelizmente, muitos fisioterapeutas entendem o corpo pelo aprendizado da anatomia. Nas faculdades a visão do corpo morto, inerte, equilibrado, ainda é o meio simples de explicá-lo. Em contrapartida, o corpo vivo é dinâmico, incerto, irregular e imprevisível. Qualquer interpretação é só um ponto de vista.

Semana passada atendia a um homem de 60 anos com dores na região lombar, em decorrência de uma espondilolistese L5, quando ele me disse: “Sinto fortes dores, e mal-estar nesta região”. Eu perguntei: “você acha que existe alguém a lhe provocar este mal-estar?”. Ele não entendeu a pergunta. Então eu pressionei suavemente a região paravertebral lombar e perguntei: “quem lhe gera mal-estar?”. Ele, ao sentir uma forte dor, me respondeu sem pensar: “a minha mulher”. Chorou copiosamente, e a dor aumentou tanto que não conseguia se levantar. Após alguns instantes, ele relaxou e a dor desapareceu. Ficou muito assustado, ele não sabia como proceder. Não entendeu porque disse aquilo. Ele se arrependeu, e ao acusar a mulher a culpa tomou posse do corpo.
Quando me deparei pela primeira vez com um processo como esse fiquei perplexo, cheguei a achar que tinha poderes sobrenaturais envolvidos. Achava que as respostas corporais relacionadas à história individual eram pura magia. O que eu não compreendia era como isso seria possível, como o corpo podia ter inteligência. A inteligência não diz respeito ao cérebro?
Contudo, o tempo passou, e pude vivenciar cada vez mais situações como essa, e aprender que a mente está em toda parte, ela não é o cérebro.
Com o tempo aprendi a recusar a ser um fisioterapeuta da máquina, e pensar em consertar peças danificadas. Assim, tive de sair do âmbito da medicina (como ciência tradicional mecanicista), e partir para um novo espaço, o âmbito do corpo vivo.
Primeiro aspecto relevante foi saber que o corpo como estrutura em processo contínuo de auto-organização (para saber mais ler a obra de Humberto Maturana e Francisco Varela) não possui causa única para um problema. Pelo fato de o corpo ser inconstante toda perturbação não tem etiologia determinada. Tudo é questão de interpretação. Toda interpretação é feita pelo observador, que a faz pela linha de um conhecimento específico.
Segundo, o corpo é tão simbólico quanto material. Isto é, se todos os aspectos de nosso corpo são percebidos a partir de uma representação cerebral (homúnculo de Penfield, por exemplo), o corpo na verdade é interpretado pelo filtro cerebral do sujeito. Assim, o que sinto e como sinto dependerá da relação de minha subjetividade para com o meu corpo objetivo.
Terceiro, nossa história está permeada pelas sensações corporais, pois o corpo é uma importante referência que temos do mundo. O que vivemos nada mais é do que aquilo que manifestamos no corpo. Por assim dizer, ele é o palco de manifestação de todas as experimentações ao longo do tempo. A física moderna nos mostra que tempo e espaço são indissociáveis, um depende do outro para existir.

Quando o homem se referiu à dor como sendo a sua esposa, ele na verdade sinalizou o conflito. A dor nada mais era do que a experiência de anos de pressão emocional. Se a emoção é uma energia em movimento expressa pelo corpo não fica difícil entender o quanto a quinta vértebra não suportou a pressão, e se deslocou em busca de harmonia.
Se o corpo busca a auto-organização para viver, busca também a manutenção da estrutura (sobrevivência). Como ele não sobreviveria tanto tempo suportando a pressão, resolveu ceder, abandonar o posicionamento e deslizar (sair) da situação.
Portanto, em um plano simbólico, que não deixa de ser material, a vértebra passou a significar a representação dele mesmo que foge – deslizamento (listese) da vértebra –do conflito com a esposa.
Vivemos em busca da harmonia, porém o nosso corpo apresenta uma linguagem muito mais complexa do que simplesmente podemos compreender pela razão. Se existe uma força inteligente que muda os ciclos de nossa natureza biológica, sem nos darmos conta, é importante levar em consideração esses aspectos no momento do atendimento fisioterapêutico. Essa visão não é simplesmente psicossomática, mas também somatopsíquico. Porque uma vez que a pessoa consiga se sentir bem (sem dores) o próprio modo de conceber os problemas da relação se torna mais fácil de ser solucionado.
Após a sessão, o meu cliente resolveu fazer uma viagem com a esposa e tentar se sentir melhor com ela. Se ele conseguiu não posso afirmar, porém com certeza ele teve muito mais chances de lograr sucesso.
Finalizando, não considero o corpo e a mente entidades separadas. O corpo, a meu ver, é a manifestação mais concebível da mente. E, pegando carona na citação de William Shakespeare, eu diria que há mais mistérios entre a mente e o corpo do que pressupõe a vossa vã filosofia.


Por Pedro Paulo Monteiro
Fisioterapeuta e Terapeuta Corporal. Autor de seis obras: Envelhecer: histórias, encontros e transformações, Quem somos nós? – O enigma do corpo, A mente e o Significado da Vida, o livro infanto-juvenil “Por que os sapos são verdes”, e os dois primeiros volumes da Coleção Envelhecer & Viver: Envelhecer ou Morrer, Eis a Questão, A beleza do Corpo na Dinâmica do Envelhecer.


http://pedropaulomonteiro.com/

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Pés perseverantes


Jornal de bairro (Morumbi, Zona Sul, Brooklin News, Campo Belo, Butantã) - 08/01/2009

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

A ADMINISTRAÇÃO DO ESTRESSE

Já que o estresse faz parte da vida, é importante que se esteja preparado
para conviver com ele. Para isto é necessário que se desenvolvam técnicas
para administrá-lo. Eis algumas delas.

Planejar-se com antecedência, contando com as dificuldades de trânsito,
para não fazer como algumas pessoas que acabam marcando mais
compromissos do que podem realizar. M.M. era uma destas pessoas
e sempre se atrasava para seus compromissos. Certo dia encontrava-se
em S. Paulo e, ao telefonar para seu médico carioca marcando uma
consulta para aquela mesma tarde, deixou escapar o seguinte raciocínio:
“Vou pegar a Ponte das duas horas e levo vinte minutos de táxi
para ir do aeroporto até seu consultório. Pode marcar minha consulta
para as duas e meia.” O médico estranhou e perguntou se o vôo
chegava às duas horas no Rio. “Não, sai daqui às duas”, respondeu
seu paciente, levando ainda alguns segundos para se dar conta de que
o avião só chegaria ao aeroporto do Rio perto de três da tarde. Isto
sem levar em consideração o fato de que sempre se perde algum tempo
entre sair do avião e chegar até a fila do táxi (que pode ser extensa)
e também sem considerar as várias possibilidades de engarrafamento
do trânsito entre o aeroporto e o consultório do médico. M.M. estava
em tratamento de uma gastrite de fundo nervoso atribuída ao excesso
de estresse e nem assim se dava conta da tensão que criava para si
mesmo ao se obrigar a horários tão apertados ou —como neste caso
— simplesmente impossíveis de serem cumpridos. É comum encontrar-
se agendas de executivos com horários congestionados ou até
mesmo superpostos.

Saber dizer não, principalmente para si mesmo. Para os outros, muitas
vezes, não é necessário se dizer não, pois muitas das dificuldades
acabam por si mesmas.

Parar de tentar fazer tudo ao mesmo tempo.

Lembrar que o exercício físico pode descansar, pelo estímulo à produção
de endorfinas.

Evitar se apressar, chegar antes da hora nos encontros, levar algo para
ler ou para fazer enquanto espera, para aproveitar o tempo e não se
sentir desperdiçando-o. Lembrar-se de que um dos maiores prazeres
da vida é a leitura, para o qual não se depende de nada, nem de
ninguém, apenas de um bom livro. É uma atividade em que todos os
alfabetizados são auto-suficientes.

Tentar descobrir o que mais gera tensão e evitar.

Zelar pelo futuro. Não aceitar compromissos e incumbências desagradáveis,
ter cuidado com a aceitação dos compromissos futuros.
Muitas vezes a pessoa se dá conta de que aceitou um compromisso
simplesmente porque, como era agendado para muitos meses à frente,
parecia fácil de ser cumprido. Um belo dia chega o momento de
enfrentar a obrigação assumida e a pessoa percebe que criou uma
desnecessária armadilha para si mesma. É como as dívidas no cartão
de crédito que depois “aquele idiota” (que é ela mesma) vai pagar. É
preciso ser otimista, realista e atento com os compromissos, principalmente
os futuros.

Administrar a inveja (das lanchas dos amigos, dos carros novos deles
etc.), pois ela causa estresse. Para isto, é fundamental admitir que ela
existe. Às vezes não se percebe a emoção negativa que invade o
subconsciente ao usufruir dos prazeres que um amigo rico pode
proporcionar. Muitos aceitam estas situações com tranqüilidade, o
que não costuma acontecer com as pessoas muito competitivas.

Evitar a companhia de pessoas de que não se gosta, principalmente
parentes (que a pessoa considere) desagradáveis.

Atentar para o fim de semana. É importante saber selecionar o lazer
e observar se se sente bem após o dia de descanso. Deve-se aprender
a melhor forma de recarregar as baterias.

Procurar comer devagar, mastigando lentamente, sem se envolver
com preocupações enquanto come. Convém evitar refeições de negócios.

Tirar férias regularmente, em extensão adequada à própria personalidade,
pois há pessoas que gostam de longas férias enquanto que
outras preferem tirar férias curtas e mais freqüentes.

Fazer um balanço do dia, observando que por vezes as pessoas
exageram a importância, a urgência e a imprescindibilidade de certas
providências.

Controlar a raiva, tentando ver o ponto de vista do outro. Dar um
tempo, respirar fundo, “contar até dez”, não levar a sério entreveros
com desconhecidos são providências bem-vindas.

Sempre se perguntar se é preciso ser tão competitivo, tão bem sucedido.
É importante entender de onde vem a cobrança de resultados
positivos em todas as áreas da vida.

Procurar ter repouso suficiente, dormir bem é fundamental. Tentar
praticar relaxamento e/ou meditação.

Lembrar-se de que, se relaxar o corpo é tão bom e saudável para o
organismo, para a mente também deve ser.

Fonte: A LINGUAGEM DA SAUDE, Luiz Alberto Py e Haroldo Jacques, Ed. Campus.